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sábado, 21 de abril de 2018

A ética cristã e o aborto

Por Eliseu Antonio Gomes

INTRODUÇÃO

Na maior parte dos grandes questionamentos éticos, a Bíblia Sagrada possui posicionamento definido e cristalino.

A ética embasada na Lei de Deus e no ensinamento de Cristo é obviamente uma escolha melhor, revela lógica e bom senso, do que uma ética que ambiciona basear-se no iluminismo ou em filosofias mais novas. A partir de um ponto de vista bíblico, é possível declarar por qual motivo o cristão deve ser ético, e também qual é a verdadeira origem da sua vontade de ser ético.

I – ABORTO:  CONCEITO GERAL E BÍBLICO.

1.1 Conceito geral de aborto.

O aborto é o fim da gravidez, a interrupção do nascimento, é a remoção de um embrião ou feto antes que ele possa sobreviver fora do útero, ou seja, é a causa a morte do embrião ou feto. Ao ocorrer espontaneamente, é descrito como aborto espontâneo. Se o aborto é causado de propósito, é então chamado de aborto induzido ou "aborto espontâneo induzido". A palavra aborto é freqüentemente usada para significar apenas abortos induzidos.

Hipócrates (460 a.C. - 370 a.C.), foi médico grego, considerado o pai da medicina na cultura ocidental, autor do juramento que leva seu nome. O Juramento de Hipócrates, escrito entre o terceiro e quinto século a.C. é um dos mais conhecidos textos médicos gregos e considerado mais que um rito de passagem para graduados em medicina. O juramento feito solenemente pelos médicos, por ocasião de sua formatura, é a expressão mais antiga da ética médica no mundo ocidental. Apresenta as bases de vários princípios aos profissionais na área da saúde que continuam sendo de suma importância na atualidade. A síntese deste documento aborda os deveres que o médico deve ter para com o seu professor e para com a profissão; inclui os princípios de sigilo e não maleficência; abrange a integridade de vida, a assistência aos doentes e o desprezo pela sua própria pessoa.

Por conta do Juramento de Hipócrates, é amplamente visto como questionável a execução da interrupção da gravidez na área legal da medicina.

A militância pró-aborto costuma salientar os seguintes argumentos a favor da sua posição, partindo da base de que o feto não seria uma vida humana:
• O direito da mulher sobre o seu corpo;
• O fato de não se autorizar o aborto faz com que haja muitos abortos clandestinos que envolvem riscos graves para a saúde;
• As mães pobres, que são forçadas a dar à luz aos seus filhos, têm muitos problemas financeiros;
• As mulheres não devem ser forçadas a trazer filhos indesejados ao mundo;
• As mulheres não devem ser obrigadas a trazer filhos gravemente deficientes ao mundo;
• As vítimas de violação ou de incesto não devem ser forçadas a seguir com a gravidez;
• A dissuação, se for usada, deve ser verbal e pessoal, e não legal;
• O apoio oficial a mães que tiveram filhos sem terem condições materiais para isso é muito dispendioso.
1.2 O aborto no contexto legal.

A consciência da pós-modernidade alega que quando permitido por lei, o aborto no mundo desenvolvido pode ser um dos procedimentos mais seguros na medicina. É discutível a afirmação da Organização Mundial de Saúde quando diz que os abortos induzidos não aumentam o risco de problemas mentais ou físicos a longo prazo, segundo matéria do Journal of Obstetrics and Gynaecology Canada, abortos realizados em instalações insalubres causam 47 mil mortes e 5 milhões de internações hospitalares a cada ano, com cerca de 45% de fracassos. 

As leis do aborto e as visões culturais ou religiosas dos abortos são diferentes em todo o mundo. Em algumas áreas, o aborto só é legal em casos específicos, como estupro, problemas com o feto,  pobreza, risco à saúde da mulher ou incesto. Em muitos lugares, há muito debate sobre as questões morais, éticas e legais do aborto.

Aqueles que se opõem ao aborto freqüentemente sustentam que um embrião ou feto é um humano com direito à vida, e assim eles podem comparar o aborto ao assassinato. Aqueles que defendem a legalidade do aborto freqüentemente sustentam que uma mulher tem o direito de tomar decisões sobre seu próprio corpo. Outros favorecem o aborto legal e acessível como uma medida de saúde pública.

1.3 Conceito bíblico de aborto.

A vida é sagrada e devemos procurar proteger toda a vida humana: o não-nascido, a criança, o adulto e o idoso. A criancinha no ventre materno não é uma massa de tecido, ele ou ela é um ser humano aos olhos de Deus. A má condição espiritual do homem é a raiz da questão que o leva a aceitar o aborto. Em quase todos os casos de gravidez indesejada, e outros perturbações, as pessoas envolvidas estão escravizadas pelo pecado. Somente quando há a conversão a Jesus Cristo é que diversos males são evitados e resolvidos.

Tal como a eutanásia, o aborto não é objeto de nenhum estudo específico nos livros da Bíblia Sagrada. Contudo, mais ainda do que em relação à eutanásia o texto de Êxodo 23.7, que aborda a defesa do Senhor ao inocente e ao justo, deve ser entendido como pondo de lado qualquer possibilidade de concretizar esse ato, pois Deus não justificará o ímpio. Na lei mosaica, provocar o encerramento da gravidez de uma mulher era tratado como ato criminoso, causar a morte do feto era cabível do pedido de retaliação (Êxodo 21.22,23).

1.4 O aborto na história da igreja.

Em 1973, nos Estados Unidos, Jane Wade foi à Justiça americana afirmando que sua gravidez tinha origem em um ato de violação e reclamava a exigência do Estado em que mantivesse a sua gravidez. Ela alegou seu direito a privacidade, com base na Constituição, e afirmou que essa privacidade se estendia ao útero. Seu caso ficou conhecido como Processo Roe-Wade. A sentença dada pelo Tribunal defendeu seu direito à privacidade e consequentemente arrastou vários outros casos de desejo ao aborto a uma situação de extrema permissividade. Vários anos depois que Jane Wade ganhou seu processo e abortou, admitiu que havia mentido, declarou que não havia sido violada e a gravidez fora consequência de falha nos métodos contraceptivos que usara. Em 1995 ela se converteu a Cristo, deixou seu trabalho em uma clínica de aborto e integrou-se a uma igreja cujo pastor é um dos líderes do Movimento Militante Pró-Vida.

O Criador não deixa de amar as mulheres que se dispuseram a abortar. Todas devem voltar o coração para Deus, não apenas para colocar esse problema em Suas mãos, mas para dedicar toda a sua vida a Ele, que deseja perdoar os equívocos do passado e guiar ao futuro com Jesus. Basta fazer um compromisso com Cristo e depois pedir a Ele ajuda para seguir realizando o que é certo.

II – O EMBRIÃO E O FETO SÃO UM SER HUMANO.

2.1 Quando começa a vida?

Se nos dermos ao trabalho de examinar a etimologia do vocábulo 'feto', constataremos que o aborto é um crime não somente hediondo, mas tremendamente covarde. No latim, a palavra fetus significa pequenino. O Dicionário Latino-Português de F. R. dos Santos Saraiva define a palavra simplesmente como filho no ventre.

Tenta-se definir em que momento, no período da gestação, o feto se transforma em pessoa. Todas as posições são subjetivas e não podem ser provadas cientificamente. Há quem defenda que só é "pessoa" ao nascer. Essa posição é a mais absurda, já que um bebê é praticamente idêntico em tudo ao bebê que nasceu no dia anterior, sendo que a única diferença é o espaço de tempo de aproximadamente 24 horas.

Apesar da situação inaceitável, só é compreensível haver quem faça defesa do aborto quando não há a percepção sobre a dimensão sacra da vida, quando não existe a compreensão de dignidade humana inerente à sua natureza. Quando se remove o transcendente, e foca-se somente numa ética materialista, o embrião é visto apenas como um amontoado de células que pode ser desprezado por qualquer motivo.

Defender o direito à vida do nascituro é a comprovação do compromisso com a dignidade do ser humano e a sacralidade da vida. A vida é santa, É uma dádiva de Deus. Por isso, é necessário aprofundarmos a visão bíblica e sacra da vida afim de que a cultura da morte, instaurada em nossa sociedade, seja finalmente sufocada.

2.2 O que diz a Bíblia.

A Bíblia nos relata sobre a origem da vida: "E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra e soprou em seus narizes o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente' (Gênesis 2.7). Após o homem ser formado através do processo sobrenatural da combinação das substâncias que há na terra, o Criador lhe soprou o fôlego da vida, dando início, assim, à vida humana. Baseado neste fato bíblico, entendemos que, cada ser que é formado, a partir da fecundação, o sopro de vida lhe é assegurado pela lei biológica estabelecida por Deus.

A Bíblia mostra claramente que, no entender de Deus, o feto é uma pessoa.
• Jó 3.3 pressupõe a continuidade entre o ser que é concebido e o ser que nasce.
• Jeremias 1.5 e Isaías 49.1 descrevem a forma como Deus se relaciona com a pessoa quando esta ainda está no ventre de sua mãe.
• O Livro de Salmos, em 139.13-16, revela de maneira comovente que Deus é quem cria o ser humano desde o útero, desenvolve o ser humano no ventre de sua mãe.
• Salmo 51.5 diz que a pessoa tem a tendência de pecar desde o ventre
• Em Lucas 1.41, João Batista é descrito como "criancinha" (brephos, em grego). O texto  narra o episódio em que ele saltou de alegria quando ainda estava no ventre de sua mãe Isabel, quando esta recebeu a saudação de Maria, que viria a ser a mãe do Salvador. E em Lucas 2.16, o mesmo termo grego é usado para descrever Jesus, já nascido.
Em Isaías 49.1, encontramos o inicio do segundo dos quatro Cânticos do Servo, que retrata a missão do Messias e há a exortação para que a nação de Israel despreze os conselhos de sabedoria humana. A passagem bíblica refere-se a Jesus Cristo, que se tornaria um ser humano desde o ventre de Maria, que teria que se encarnar e seria conhecido como o Emanuel, que significa Deus conosco (Isaías 7.14).

Sobre a chamada ao ministério profético de Jeremias temos, no capítulo 1 e versículo 5, a informação que Deus o chamou antes que ele fosse formado no útero de sua mãe. Não se trata de reencarnação, trata-se do conhecimento absoluto que Deus tinha de Jeremias e do seu plano soberano para a vida dele antes que ele fosse concebido. Entendemos, assim, que a vida inicia na fecundação.

Em Gálatas 1.15, Paulo escreve que Deus o separou ao ministério apostólico antes que ele nascesse. Com isso, não queria dizer que ao nascer foi separado fisicamente de sua mãe, e sim sobre o momento que foi colocado à parte por Deus para o serviço apostólico, momento este que ainda não havia nascido.

2.3 Qual a posição da igreja?

No mundo greco-romano era comum a prática do aborto. Foi preciso que os pais da igreja entrassem em cena condenando essa prática. No Didaquê 2.2 existe a seguinte recomendação: "Não matarás o embrião por meio do aborto, nem farás que morra o recém nascido".

Essa questão contribuiu para estabelecer o debate acirrado, primeiro entre os gregos e depois entre os cristãos, sobre o momento em que o bebê, ainda em formação, recebia a alma, tornando-se um ser humano. Por influência de Aristóteles, o pensamento cristão aderiu à ideia de que o feto era animado pela alma humana apenas em uma fase tardia de sua gestação. Tomás de Aquino afirmou depois que na primeira fase o feto tinha uma alma vegetal, na segunda tinha uma alma animal e só na terceira recebia uma alma que podia ser considerada humana. Em 1588, o Papa Xisto V eliminou esse princípio aristotélico.

III – TIPOS DE ABORTO E SUAS IMPLICAÇÕES ÉTICAS.

A legislação brasileira autoriza a interrupção da gravidez em três casos somente. Neste tópico apresentamos as principais implicações éticas para estes tipos de aborto.

3.1 Aborto de Anencéfalo

Em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) legalizou a interrupção da gravidez de feto anencéfalo (má-formação rara do tubo neural). A principal implicação ética desta decisão está no descarte de um ser humano por apresentar uma má formação cerebral. Trata-se de uma ideologia racista chamada "eugenia" que defende a sobrevivência apenas dos seres saudáveis e fortes. Uma nítida incoerência de quem defende os direitos humanos e ao mesmo tempo age de modo discriminatório. Neste quesito enfatizam as Escrituras: para com Deus, não há acepção de pessoas (Romanos 2.11). Como aceitar a ideia de que Deus permitiria a concepção de um ser humano e logo após o rejeitaria em seus primeiros dias de existência?

Estar neste mundo ou deixá-lo é uma decisão que cabe ao Criador e jamais algo que satisfaça aos desejos pessoais de alguma criatura humana. Cada ser gerado tem um propósito nobre a cumprir, maior que a vontade pessoal, portanto, interromper uma gestação é notadamente um enorme equívoco. Portanto,  ajamos com sabedoria, prudência e critério, nunca nos esquecendo da sacralidade da vida humana. As Escrituras Sagradas afirmam que a vida e a morte são, unicamente, da alçada divina (1Samuel 2.6; Filipenses 1.21-24).

3.2 Aborto em caso de estupro. 

Como não é necessária a comprovação do crime de estupro e nem autorização judicial para o aborto, a lei é permissiva e complacente com a interrupção da gravidez sob a alegação de estupro sem que ele tenha ocorrido. Assim, discute-se a inviolabilidade do direito à vida do nascituro (Art. 5°, CF e Art. 2° do CC). Outra questão ética relaciona-se ao fato de que um crime não pode justificar outro crime.

A implicação ética em relação ao aborto no caso de estupro relaciona-se ao fato de que um crime não pode justificar outro crime. Não convém reagir ao mal cometendo maldade. A reação do crente convertido a Cristo é mudar a situação da maldade para atitudes de bondade, benevolência, benignidade, magnanimidade. Aos cristãos. o ensino bíblico é claro: "Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem" (Romanos 12.21).

3.3 Aborto terapêutico.

O caso do aborto terapêutico é um caso que não deve haver penalização. Há a opção, muitas vezes angustiante, entre a tentativa de salvar a vida de uma pessoa, a mãe, e o risco de perder a vida da mãe e do filho.

É Deus quem dá a vida e nos permite viver em nosso corpo físico. Podemos decidir quem deve viver ou morrer? Procura-se justificar clinicamente a ação do aborto, no caso do risco da mãe perder sua vida no parto, sob a alegação de que a vida de um adulto tem maior valor que a de um ser em gestação. Daí surge questões éticas quanto à valoração da vida humana. Uma pessoa merece viver e outra não? Tertuliano, em sua obra Apologeticum (197), ensinava que não existe diferença entre uma pessoa que já tenha nascido e um ser em gestação. Outra questão é acerca do poder sobre a existência.

Uma mãe cristã, confiante no Senhor e na sua obra redentora, pode se recusar a abortar, mesmo quando o médico aconselhar o aborto terapêutico. Sabe-se de casos em que Deus interveio salvando a vida da mãe e do filho. É claro que não podemos esperar que a legislação, criada para crentes e descrentes, tente forçar esta opção.

CONCLUSÃO

Hoje em dia é comum pensar no aborto como uma resposta simples a uma situação inconveniente, mas na verdade a decisão de uma mulher em acabar com a vida de uma criancinha que está se desenvolvendo dentro dela, é um problema muito sério. Algumas das consequências invisíveis sobre a decisão de realizar o aborto é o profundo pesar e o sentimento da culpa pelo que aconteceu, assim esta mulher que poderia escolher dar à luz e ao bebê, mas opta em negar a ele a luz, entra em profunda crise depressiva. Ao lidar com o tema do aborto, o evangelista Billy Graham costumava dizer que "dois erros não criam um acerto". Aconselhava gestantes que não desejavam criar uma criança a optar por enviá-la para a adoção.

Todos os cristãos comparecerão diante do tribunal de Cristo, no segundo advento, portanto deve estar empenhado em pregar a revelação da Palavra de Deus exatamente como ela é. estar sempre preparado para proclamar a Verdade, deve abordar a questão do pecado na vida daqueles que servem ao Senhor e na vida de quem é pecador não arrependido. A doutrina de Cristo deve ser exposta com mansidão, mesmo que rejeitada (1Timóteo 4.1,2).

Valorizar a dignidade humana, o direito à vida e o cuidado à pessoa vulnerável são princípios imutáveis do cristianismo. Na sociedade secular, o cristão autentico deve tomar cuidado com o relativismo e estar alerta quanto às ações de manipulação de sua consciência e o desrespeito à vida humana.

É apenas da alçada de Deus levar o homem à beira da tumba e quando toda a esperança parece ter tido o fim, levantá-lo outra vez.

E.A.G.

Compilações:
Billy Graham Evangelistic Association, Billy Graham’s Answers on Abortion, January 25, 2017, https:// billygraham. org/ story/ billy-grahams-answers-on-abortion/ 
Ética Cristã Hoje - vivendo um Cristianismo coerente em uma sociedade em mudança rápida, Alan Pallister, páginas 147 a 154, edição 2005, São Paulo (Shedd Publicações).
Lições Bíblicas Adultos, Ética Cristã: Confrontando as Questões Morais de Nosso Tempo, 2° trimestre de 2018, página 44 (CPAD).
Wikipedia / EUA - https://en. wikipedia . org/ wiki/ Hippocratic_Oath 
Wikipedia / EUA - https://en. wikipedia . org/ wiki/Abortion 

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