Primeiro, o dicionário:
"so.nho: sm (lat somniu) 1 Representação em nossa mente de alguma coisa ou fato, enquanto dormimos. 2 Coisa imaginada, mas sem existência real no mundo dos sentidos. 3 Coisa ou pessoa vista ou imaginada durante o sono. 4 Imaginação sem fundamento, seqüência de idéias vãs e incoerentes, às quais o espírito se entrega; devaneio, fantasia, ilusão, utopia. 5 Ficções comparáveis a um sonho e a que muitas pessoas se entregam mesmo acordadas. 6 Coisa vã, fútil, transitória, sem consistência, sem alcance, sem duração. 7 Coisa vaporosa e inconsistente; visão. 8 Recordação de coisa efêmera e que pouca impressão deixou na alma. 9 Idéia com a qual nos orgulhamos; idéia que alimentamos; pensamento dominante que seguimos com interesse ou paixão".
O que temos aqui? Encontramos nove sentidos distintos para um só substantivo (sonho). Cada sentido é diferente um do outro. Não estranhe isso, pois a maioria das palavras têm mais de um significado, é um fenomeno existente em todos os idiomas, em todos os tempos.
A Bíblia e o sonho de Deus
Que espécie de sonho teria o Criador, se Ele não dorme? Vamos fazer a conexão entre o dicionário e o texto bíblico:
"Porque eu bem sei os pensamentos que tenho a vosso respeito, diz o SENHOR; pensamentos de paz, e não de mal, para vos dar o fim que esperais" - Jeremias 29.11.
Antecipando aos argumentos que desprezam a Palavra de Deus nos textos do Antigo Testamento, criticando a aplicação da primeira parte das Escrituras Sagradas, relembro que os livros desde Gênesis ao Zacarias foram usados por Jesus Cristo e os apóstolos. Os Evangelhos e as Cartas estão repletos de citações veterotestamentárias
O apologista que não quer sonhar e nem aceitar o sonho de Deus
Eu sei que a atitude da maioria dos apologistas são derivadas de ótimas intenções.
Os leitores alfabetizados e os analfabetos funcionais
Ao fazer uso da leitura, é preciso puxar pela memória e raciocinar, é necessário observar o vocabulário sem pressa para entender os textos lidos. Neste caso que tratamos (sonhos), o termo que se encaixa perfeitamente com a Bíblia Sagrada é o nono, encontrado no dicionário.
É preciso levar em conta que toda literatura tem seu estilo e regras próprias. Para interpretar o texto corretamente o leitor deve identicar completamente qual tipo de texto lê e considerar seus parâmetros e seu contexto. Só assim é possível entender a proposta do autor.
A letra musical está sempre perto do estilo poema/poesia. Tanto é assim que se você quiser registrar uma letra de música na Biblioteca Nacional (para proteger o direito autoral), o registro será dirigido ao estilo poema/poesia.
Sobre poesia: quem escreve em versos tem maiores recursos de linguagem do que quem escreve em prosa. O poeta tem liberdade para escrever, a extensão da liberdade dele é infinita, a criatividade é o seu limite!
O apologista cristão, então, que não queira se passar por ridículo, deve ater-se a isso, se deseja continuar se prestando ao papel hemeneura da poesia contemporânea, encontrada nos CDs e DVDs evangélicos.
A licença poética em letras evangélicas e na Bíblia
Sobre "sonhos clamarem", temos aí uma figura de linguagem personificando o sonho. Bem, nem posso dizer que seja um grande achado criativo. Na Bíblia encontramos esta figura também. Salomão escreveu que a sabedoria clama nas praças.
"A sabedoria clama lá fora; pelas ruas levanta a sua voz" - Provérbios 1.20.
"Não clama porventura a sabedoria, e a inteligência não faz ouvir a sua voz?" - Provérbios 8.1.
Todos nós sabemos que o sonho e a sabedoria não são pessoas. Então, é necessário contextualizar para entender a proposta do autor. Tanto a sabedoria quanto o sonho possuem sua força para determinar o que fazemos ou deixamos de fazer.
Pela linha da crítica textual dos apologistas de então, que abominam letras com o recurso da personificação, fica a pergunta retórica: Será que Salomão errou ao fazer uso da licença poética?
E.A.G.