Daladier Lima
Há, em
hebraico, ao menos duas palavras cuja raiz expressa diretamente uma promessa ou
juramento. Abaixo as colocamos em hebraico, com sua transliteração:
A primeira é alah, e diz
respeito ao compromisso objetivo, à descrição do que é acertado. Alah é da mesma
raiz de Elohim, daí não ser novidade que Deus é um Deus que se compromete e
cumpre (Jr 1:12). E a segunda, dabhar, diz respeito ao ato e à palavra
empenhada para a consecução do compromisso. Davar se refere ao emprego de palavras onde se promete alguma coisa,
tenha o promitente consciência de suas implicações ou não. O substantivo alah ocorre muito mais vezes que o
verbo no texto original, apesar de terem o mesmo formato. Uma conotação
paralela vem da palavra berith, que
significa aliança. De modo que quando alguém faz uma aliança (berith) com alguém, jura (alah) através de sua palavra (davar).
Nos relatos
mais antigos de juramentos e alianças não existem documentos escritos,
assinaturas reconhecidas em cartório, ou coisas semelhantes, para que alguém cumpra
o que prometeu. Apenas a palavra é suficiente, muitas vezes assumida
publicamente, à porta das cidades, na presença dos mais velhos, como
recomendavam as tradições mais arcaicas. Expressa tanto juramentos entre homens,
como Abraão fez com Eliezer em Gn 24, como entre Deus e os homens em Gn 6:18. Promessas
do ponto de vista de Deus não precisam de assinaturas de qualquer natureza,
afinal ele não é o homem para que minta (Nm 23:19)! Do ponto de vista do homem
há vários exemplos de juramentos escritos, alguns dos quais do homem para com
Deus, como alguns dos Salmos. O Salmo 119, por exemplo, é um juramento para
seguir a Lei do Senhor.
A palavra é,
portanto, a verbalização do contrato assinado mentalmente (intencionalmente)
entre as partes. Documentos antigos mostram que quando o juramento tinha vulto,
os contratantes imolavam e dividiam os pedaços de alguns animais. Em seguida,
passavam por entre aquelas partes como a testemunhar que assim deveria ser
feito a quem falhasse. É exatamente o que acontece em Gn 15:17, quando Deus se
apropria de um simbolismo humano, para mostrar a Abraão seu empenho no acerto.
Ainda que no caso em
apreço Abraão tenha falhado, Deus permaneceu cumprindo sua
parte, inclusive, exigindo em Jesus a morte que não recaíra sobre Abraão.
Há promessas
de vitória (Êx 3:8) e de derrota (Dt 28:20). Deus é justo o suficiente para
zelar por ambas (Na 1:2). O mesmo empenho que Ele teve para fazer com que
Abraão gerasse filhos na velhice apesar de seu sorriso zombeteiro (Gn 17:17),
teve para espalhar Israel pelas nações por causa da idolatria (Compare Dt 4:27
com Ne 1:8), inclusive, uma parte das tribos que foi para a Assíria não voltou
do cativeiro até os dias modernos. Como dizíamos é um compromisso, para o bem
ou para o mal, para a morte ou para a vida. Às vezes, um compromisso de derrota,
gera uma maldição, porque se repete através de diversas gerações (Dt 5:9), o
mesmo ocorre com a benção que é perpetuada nos filhos (II Rs 15:12).
Curiosamente, nós só esperamos de Deus promessas de vitória, mas não é isso
apenas o que a Bíblia mostra.
Como os
seres humanos se especializaram na arte de falhar com os compromissos
assumidos, com outros e com Deus, as promessas divinas tomaram uma relevância
importante, a ponto de um salmista desiludido afirmar: É melhor confiar no
Senhor do que confiar no homem (Sl 118:8), nem mesmo os príncipes são
confiáveis (Sl 118:9). Quando adicionamos o ingrediente da morte, que fez com
que muitas pessoas falhassem nas suas promessas, dada a finitude da vida, então
restou somente Deus. E Ele não foge à sua responsabilidade quando, por exemplo,
prometeu a Abraão que seus filhos voltariam para Canaã, após a quarta geração
(Gn 15:16), e mesmo estando este homem ilustre morto há muitos anos, cumpriu!
Às vezes, a
promessa é um objetivo a ser alcançado com a ajuda de Deus. É o que aconteceu a
Israel. Embora a terra que mana leite e mel estivesse prometida, Deus estaria subordinado à disposição do povo para conquistá-la. Quando eles lutavam
adequadamente a vitória era certa, caso contrário eram entregues nas mãos dos
inimigos (Jz 2:14). Isto acontece para que não pensemos que fomos nós que
conseguimos a vitória (Jz 7:2), para que toda a honra, a glória e o louvor
sejam dados a Deus. E para que nossa vigilância não dê lugar ao comodismo. Em
outras palavras, pensaríamos: se Deus prometeu, então Ele que cumpra.
Exceto,
naquelas situações em que as forças humanas se acabam, quase sempre Deus usa o
homem como instrumento do cumprimento de suas promessas. Até mesmo quando
cumpre uma maldição. É o caso de Nabucodonosor, que Deus usou para cumprir seus
juízos sobre várias nações (Ez 29:18,19). Foi a liderança de Josué, por outro
lado, tonificada pela ordenança divina, que possibilitou a entrada em Canaã (Js
1:9).
Deus não
está atrelado aos anos para cumprir suas promessas, basta-nos ver Gn 3:15. Do
ponto de vista do homem, temos sempre pressa. Uma pressa que acaba
personalizando nossa necessidade. Do ponto de vista de Deus, as coisas
acontecem em pararelo umas com as outras, de maneira que situações diversas
estão interconectadas. Deus promete a Abraão (Gn 15:16) que seu povo desceria
ao Egito, somente para que não pereça na fome em Canaã. Uma atitude que
soa desconcertante, mas que José capta bem (Gn 45:5-7). Jacó poderia pensar ser
penoso que Deus não tenha o abençoado ali mesmo onde morava, mas a benção
precisava repercutir. Quatrocentos e trinta anos depois é que houve o regresso.
Logo, o abrangente relógio kairológico de Deus nem sempre se enquadra no
restrito relógio cronológico humano (Is 55:8). Assim se expressa o salmista: Porque
mil anos são aos teus olhos como o dia de ontem que passou, e como a vigília da
noite (Sl 90:4).
Em alguns
casos um posicionamento errado do homem pode anular uma aliança de Deus. Foi o
que aconteceu a Saul, em I Sm
15. A
ordem que foi-lhe dada era para destruir tudo dos amalequitas. Mas não foi
cumprida. Então Deus anulou a escolha que havia feito (I Sm 10:24) e pôs outro
em seu lugar (I Sm 28:17). O que nos leva a concluir que escolhas erradas
possam mudar o curso de uma promessa de Deus em nossa vida. De fato, ações
erradas de nossa parte podem, conforme diz a Palavra de Deus, até mesmo
abreviar a vida (II Cr 35:21). Por outro lado, promessas de morte podem se
tornar em promessas de vida, quando alguém ora ao Senhor, foi o que aconteceu a
Ezequias (Is 38:21).
Que tenhamos paciência para aguardar o cumprimento das promessas de Deus em nossa vida. Ele não falhará!