Praça do Trianon - São Paulo [SP] |
Uma jovem segurava a bandeira vermelha do Partido dos Trabalhadores. Até aí, coisa normal para um momento que se aproxima do dia da eleição. O que despertou a atenção foi ver a garota encostada em um poste de luz como se fosse uma estátua. Ela mantinha sua cabeça abaixada, olhos fixos na tela de seu smartphone, que segurava em sua mão direita; com a mão esquerda ela movia em círculo a bandeira. E não se mexia para mais nada! No gramado, próximo aos pés, um saco plástico cheio de panfletos que deveria estar distribuindo, provavelmente sobre o candidato à presidência e ao governo do estado paulista.
Aquele ser humano, provavelmente ainda em início de puberdade, lembrava algum mecanismo inanimado e primário, impulsionado em movimentos repetitivos por conta de energia elétrica. Brincalhona, minha esposa viu a cena e sorriu.
- Eu quero falar com essa menina - disse abaixando o vidro do carro.
- Ei, ei, bom-dia, que dia lindo!
Nenhuma reação. Olhos ainda estatelados no aparelho, corpo imóvel, ombro direito encostado no poste, só o braço esquerdo a girar lentamente a bandeira vermelha. Quando o veículo chegou bem pertinho dela, foi possível ver o cabo preto do fone de ouvidos entrelaçado nos fios de seus cabelos lisos e escuros. Talvez assistisse um clipe de música, um filme ou vídeo enviado especificamente a ela por alguém conhecido.
Naquele instante foi possível entender que a garota estava presente ali apenas em busca de alguns trocados. Estava ali apenas fisicamente, mas a alma estava onde só ela sabia, não havia em seu coração uma só gota de paixão política, não possuía motivação ideológica ao empunhar a bandeira e se propor a ser cabo eleitoral. Ela seria alguém capaz de tremular bandeira para o outro lado político por alguns centavos à mais?
Esta jovem é o símbolo de muitos brasileiros alienados. Assistia algo no aparelho sem perceber que no mesmo momento era assistida por diversos motoristas naquela avenida paralisada. Para gente como aquela garota, o mundo pode fazer muito barulho, apesar de todos os ruídos elas permanecerão estáticas dentro de uma esfera insignificante e abstrata.
Para não terminar esse relato usando o clichê, "seria cômico caso não fosse trágico", porque creio que isso é uma realidade ainda mais esquisita, comparo a situação como muitos quadros que Pablo Picasso pintou, quem os vê atentamente fica com a impressão que a obra não está terminada.
E.A.G.
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