O cristão evangélico e a interatividade com Deus

Muito se tem falado sobre a interatividade nos últimos tempos. Sabe-se que o ser humano é capaz de manter relações de troca com o seu ambiente e com as pessoas que são parte dele. Tem a capacidade de influenciar e ser influenciado, incentivar ações e obter respostas. Mas jamais explorou-se tanto esse aspecto de comunicação.

O que significa interação? Diz-se que é o processo de adoção recíproca de papéis, o desempenho mútuo de comportamentos estáticos. Noutras palavras, é o efetivo preenchimento de espaço entre dois seres que se comunicam. Em um modelo ideal, estes indivíduos possuem tanta intimidade, que o pensamento e a postura do primeiro se espelham no segundo, resultando em atitudes e ideias semelhantes.

Interação é como o ideal de toda comunicação interpessoal. Transportando esse conceito para a esfera religiosa, surge a pergunta: é possível manter um relacionamento interativo com Deus, que é um Ser que não conseguimos enxergar e não passa de uma hipótese para a ciência? 

A Bíblia da variados relatos de homens que se comunicaram interativamente com Deus. Abraão, Moisés, José, Davi, Elias, entre outros. Em destaque, Enoque, cuja biografia mereceu interrupção da extensa narrativa genealógica no livro de Gênesis [5.22 a 24]. Com certeza, havia algo de peculiar nesse homem, que fez o autor suspender temporariamente sua exposição.

Enoque era filho de Jarede. À semelhança da sua família, proveniente de Adão, Enoque cultuava verdadeiramente Deus e vivia piedosamente, distinguindo-se dos seus demais habitantes do mundo pré-diluviano. Aos 65 anos gerou Matusalém. É aqui que o autor faz uma pausa para dizer que Enoque andou com Deus, viveu de acordo com a vontade divina. Após o nascimento do seu filho primogênito, Enoque passou uma experiência mais profunda, uma experiência mais íntima com Deus.

Por caminhar com Deus, Enoque passou a refletir o caráter divino. Notam-se aí indícios de interação. Ao ter Deus como seu amigo mais íntimo, tornou a ser semelhante a Ele, diferenciou-se de seus contemporâneos por alcançar um nível de amizade nunca antes alcançado. 

A parte mais bonita na história de Enoque é o fato de que a interação era tão íntima, os laços de amizade eram tão fortes que Deus o tomou para si [Gênesis 5.24]. Renunciando a lenda e crendices a respeito desse personagem, podemos afirmar que a transladação se deveu à sua íntima ligação com Deus. A amizade ultrapassou os limites das fronteiras terrenas.

É importante refletir acerca dessa ilustre amizade no cenário religioso  pós-moderno, abundante em secularismo e indiferença, ou na banalização da experiência religiosa. Se o cristão crê num Deus interpessoal, um Deus que dá e recebe  amor, nada mais natural que busquem interagir com Ele. Está é uma das características que diferencia o cristianismo do budismo e do confucionismo. Para essas filosofias, em linhas gerais, Deus está muito distante para que haja interação. Morrer na cruz para apenas um pecador estaria fora de cogitação.

Não é fácil manter-se harmonizado com Deus, principalmente nos dias de hoje. Vale ressaltar que ao fazer de Deus um amigo íntimo, Enoque não se tornou um fanático ermitão.

Só é possível um caráter semelhante aos de Cristo, mediante a vivência diária com Ele. Sem essa interação, o cristianismo não tem sentido de existir. Porém, à medida que a interação se desenvolve, descobre o Deus amigo, amoroso e pronto para suprir todas as carências humanas de afeto. É esse contato que faz a mensagem cristã tão incomum e maravilhosa.

E.A.G.

Título original: Interagindo com Deus, escrito por Fernando Torres. Extrato do periódico "Revista Mais Destaque", ano 6, numero 24, edição janeiro a fevereiro de 2009, página 20. www.maisdestaque.com.br . Adaptado, resumido.zzz