"Sejam praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando a vocês mesmos' [...] não sendo ouvinte que logo se esquece, mas operoso praticante, esse será bem-aventurado no que realizar" - Tiago 1.22,25.
Que erro terrível o do crente que se limita a ler as Escrituras, a ter prazer nelas,mas não as pratica! É bastante comum o cristão ouvir a Palavra de Deus regularmente, com sincero fervor, mas não obedecerem às suas ordenanças. Se um empregado deles agisse assim - ouvisse, mas não atendesse - ficariam furiosos. E a cegueira é tão profunda que eles nem se dão conta de que não estão vivendo plenamente a vida cristã. O que ocasiona esse tipo de engano?
Uma causa disso é o fato de as pessoas pensarem que o prazer de ouvir a leitura bíblica é a própria espiritualidade e adoração a Deus. O intelecto se deleita quanto uma verdade lhe é apresentada com clareza; a imaginação se sente gratificada com suas ilustrações; as emoções se empolgam com sua aplicação. Qualquer mente ativa sente prazer em receber conhecimento. É possível uma pessoa estudar um ramo da ciência - eletricidade, por exemplo - apenas pela satisfação de obter conhecimento sem a menor intenção de pô-la em prática. Assim também há pessoas que vão à igreja e gostam de ouvira pregação, mas não vivem o que Deus ordena. Desse modo, tanto o crente como o incrédulo podem cair na rotina de pecar e confessar, pecar e confessar de novo.
Outro fator que causa esse erro é a terrível e errônea ideia de que é impossível viver sem pecar. Pouca gente crê que a graça de Cristo pode nos capacitar a obedecer, nos guardar, nos guardar para que não pequemos e nos tornar santos. Na prática, todos pensam que se acham contaminados pela obrigatoriedade de pecar. Acreditam que o Senhor não pode esperar que lhe prestemos uma obediência irrestrita, pois sabe que não somos capazes disso. Esse pensamento errado decepa, na base, qualquer propósito que possamos fazer de obedecer a Deus. E simplesmente rejeitamos todo anseio de crer e experimentar tudo que Deus, em sua graça, pode operar em nós. Assim, os crentes continuam pecando sem que isso os incomode muito. Ouvir e não praticar, que terrível forma de enganar a nós mesmos!
Existe ainda um terceiro motivo que se acha associado à nossa leitura bíblica devocional. É a prática de ler a Bíblia - ou ouvir sua leitura - por um dever, por um exercício religioso. De manhã, passamos de cinco a dez minutos lendo a Palavra. Lemos com atenção, meditando nela e procurando absorver bem o seu conteúdo. Cumprindo esse dever fielmente tranquilizamos nossa consciência e nos sentimos satisfeitos. Tal atitude indigna provoca endurecimento do coração. Precisamos tomar a firme a decisão de fazer tudo que a Bíblia ordena e de ser como ela determina: "Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos."
E será no aposento da oração, na vigília matinal, que iremos combater e derrotar esse engano. Talvez achemos que tal prática venha a atrapalhar nossa leitura regular e obrigar-nos a atrasá-la um pouco. Não é necessário que seja assim, mas é melhor acontecer isso que continuarmos sem resolver essa questão. Tudo depende dessa decisão, Jesus afirmou o seguinte: se alguém quiser fazer a vontade dEle, conhecerá a respeito da doutrina, se ela é de Deus ou se eu falo por mim mesmo" (João 7.17). Só quem se deleita na Lei de Deus e já decidiu obedecer-lhe recebe a iluminação divina intimamente, pela qual reconhece que o ensino de Cristo tem sua origem e autoridade em Deus. Se não tomarmos a deliberação de obedecer, não tiraremos nenhum proveito do conhecimento obtido, que não passará de mera informação intelectual.
É só pela prática que verdadeiramente chegamos a conhecer, seja o que for, na vida, nas ciências, nas artes e nos negócios. Aquilo que o homem não consegue fazer, não conhece de fato. A maneira certa de se conhecer a Deus e provar suas bênçãos é viver sua vontade na prática. Assim demonstraremos se o Senhor em quem dizemos crer é um Deus criado por nossos sentimentos e imaginação, ou o Deus vivo e verdadeiro, que domina sobre tudo. Somente quando fazemos a sua vontade é que provamos que a queremos de fato, que a aceitamos e nos achamos unidos a ela. E esse é o único meio pelo qual podemos nos unir ao Senhor: fazer sua vontade.
Como podemos corrigir o erro de ouvir a Palavra e não praticá-la? A solução é lutar contra esse erro no íntimo, no momento em que fazemos a leitura bíblica devocional particular, tomando a decisão de resolver a questão em termos absolutos.
Vou obedecer ao que Deus ordena
Portanto, vejamos como se deve ler um texto da Palavra de Deus com a decisão de praticá-lo. Tomemos como exemplo uma passagem do Sermão do Monte, a primeira bem-aventurança: "Bem-aventurados os humildes de espírito." Para aplicá-la em nosso viver, vamos responder as seguintes perguntas:
"O que Deus está dizendo aí? Estou observando esta determinação todos os dias diligentemente? Estou procurando cultivar essa disposição? Estou disposto a esperar em Deus e pedir a Cristo quare opere isso em mim, crendo que Ele o fará? Vou praticar isso, ser uma pessoa humilde em espírito? Ou vou continuar sendo apenas ouvinte da Palavra e não praticante?"
Leiamos desse modo todas as bem-aventuranças e todo o sermão, aplicando a cada verso as mesmas perguntas. Normalmente, nossa resposta será a seguinte: "Será que entendo o que isso significa? Estou vivendo esta orientação prática?"
Provavelmente nossa resposta será a seguinte: "Não, não vejo a menor possibilidade de viver dessa maneira e praticar o que Deus diz."
Nesse caso, sentiremos que rever nossas crenças e nossas conduta. Ademais, não saberemos dizer ao certo se já aplicamos na vida diária e na leitura, realmente, na vida e na leitura bíblica, a decisão de fazer tudo o que Ele manda.
Esse exame introspectivo certamente nos levará a uma humildade de espírito nunca antes conhecida. Veremos ainda o quanto precisamos de um Cristo que venha soprar em nós tudo o que Ele ordena. Assim teremos fé e coragem para afirmar: "Tudo posso naquele que me fortalece" (Filipenses 4.13). E na prática tudo tudo o que Ele diz em sua Palavra.
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