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terça-feira, 24 de abril de 2018

Ética Cristã, Pena de Morte e Eutanásia

INTRODUÇÃO

Em definição simplista, morte é o fim da vida, o término absoluto da vida. Na área da Ética, o modo de lidar com este vocábulo é intrigante, complicado e incômodo: Será que a pessoa acaba-se somente no momento em que seus sinais vitais já não são notados? Os dilemas éticos impelem a comprovar a falência encefálica de um adoentado antes mesmo da parada cardíaca.

Temas como eutanásia e pena de morte agitam profundamente as emoções de cada um de nós. Então, é sempre pertinente refletir sobre como é digno de apreço o tempo de existência do ser humano. A cada novo amanhecer surgem novas oportunidades dadas por Deus para que vivamos melhor. Se procedemos ofensivamente, há a chance de corrigir o erro. Se não erramos, temos a possibilidade de reafirmarmos ainda mais a confiança nAquele que é a fonte de todo contentamento. Em ocasiões extremas, temos a oportunidade de confirmar a fé e a crença nas promessas contidas na Palavra de Deus. Em todas as circunstâncias, celebremos a vida (Salmo 118.24).

I - A PENA DE MORTE NAS ESCRITURAS


1.1 No Antigo Testamento.

"Não seria justo que uma pessoa que mata, também morra?" Às vezes, tal indagação surge de alguém que perdeu uma pessoa querida, envolve os sentimentos de tristeza e justiça. A situação possui cunho da Ética Cristã. É preciso formar opinião com base bíblica sobre casos assim.

A pena de morte perpassa a história da humanidade e é bíblica. O Antigo Testamento estabelecia a pena capital. No tempo de Noé, ela é vista possivelmente como forma de frear a violência que multiplicava-se naquela civilização.

Após a saída dos israelitas do Egito, a pena de morte fez parte do código da lei mosaica, foi regulamentada tendo como base o Decálogo, normatizando-se a penalidade para diversos delitos. Foi usada como castigo: "sangue por sangue e vida por vida" (Êxodo 21.12, 23). Instituída para punição a quem praticasse crime intencional, premeditado, valendo-se de má fé. O regulamento não contraria o sexto mandamento, pois o verbo hebraico rãtsah presente na sentença "Não matarás" (Êxodo 20.13), significa "não assassinarás", proíbe de fato o homicídio doloso ou qualificado.

Quando o indivíduo era acusado de matar, a Lei de Moisés exigia que o Estado fizesse justiça. Para o devido processo legal ao menos duas testemunhas eram requeridas para a efetivação da demanda (Deuteronômio 17.6). Assim, a sentença de morte do homicida era vista como a prática da justiça contra a impunidade. Porém, havia exceções. Quando Davi adulterou e premeditou a morte de Urias, a execução da pena de morte não foi aplicada ao monarca (2 Samuel 11.3,4,15; 12.13). Neste caso. Deus tratou pessoalmente do pecado do rei (2 Samuel 12.10-12).

A ideia de amenizar o uso da pena de morte surgiu com o advento do humanismo iluminista, por volta do século dezoito.

1.2 No Novo Testamento.

Nos Evangelhos, não houve abrandamento para a pena de morte.

João Batista, quando foi confrontado por grupos de pessoas arrependidas, que buscavam orientação para suas vidas, não recomendou aos soldados que deixassem a vida militar. Seu conselho foi no sentido de não tratar mal nem defraudar ninguém e que estivessem satisfeito com o salário  (Lucas 3.14).

Encontramos nas cartas de Paulo um ensino esclarecedor sobre este assunto. Na época em que o apóstolo viveu, havia uma sociedade em que a aplicação da pena de morte e o envolvimento na vida militar eram situações consideradas comuns. Ao magistrado, ou autoridade civil, estava confiada a "espada", isto é, o direito de tirar a vida àqueles que desobedeciam a lei. As orientações de Paulo sobre esta questão não ensina que  essa ordem seja, em essência, ímpia, nem que o poder da espada deva ser considerado diabólico, mas que o cristão deve se submeter e orar a favor daqueles que estão no poder (Romanos 13.1-4; 1 Timóteo 2.1-2).

No Antigo Testamento, ofensas como o adultério, o incesto, etc, eram punidas com a pena de morte. O Estado que punia estava sob o regime teocrático, não havia distinção entre o poder civil e o religioso. O Novo Testamento foi escrito para as igrejas em sociedades não teocráticas. Obviamente, as igrejas não têm poder de aplicar a pena capital e este nunca foi o seu papel. Em Romanos 13.1-7, Paulo define o poder da sociedade civil e exorta a igreja não a aplicar as penalidades que competem às autoridades, mas sim a se sujeitar às autoridades do poder civil nesse aspecto.

No assunto da pena de morte e em todos os outros, necessitamos ter em vista uma ética que se preocupe com a vida em sua integralidade, durante toda a existência da pessoa. Jesus possui em favor de toda a humanidade a 'ética do cuidado'. Ensina a valorizar a vida acima das coisas. O cristão precisa praticar a Ética de Cristo, que nos transforma em modelos da prática do amor ao próximo e, principalmente, aos mais necessitados. Fazendo assim, o cristão não agirá como transgressor da lei vigente na sociedade em que é cidadão.

Em nossos dias, existe uma grande discussão sobre o assunto, embora não haja consenso. Em função da progressão da violência existente, não são poucas as pessoas que desejam a pena capital. Embora haja respaldo bíblico para a pena de morte, nós cristãos continuamos a crer que existe a verdadeira transformação, aquela operada pela regeneração em Jesus Cristo e atuação do Espírito Santo no homem interior.

O cristão autêntico tem a obrigação de esforçar-se para estudar a Bíblia Sagrada e tornar-se apto a refletir sobre a pena de morte partindo de um embasamento bíblico-teológico, à luz da Ética Cristã. Fazendo assim, passará a reconhecer que na Bíblia há respaldo para a pena de morte, não como regra, mas como exceção.

II - EUTANÁSIA: CONCEITOS E IMPLICAÇÕES



2.1 O conceito de eutanásia.

O vocábulo "eutanasia" foi usado pela primeira vez pelo filósofo inglês Francis Bacon (1561-1627). Etimologicamente a palavra "eutanásia" vem de dois termos gregos: eu, com significado de “boa” ou "fácil" e thánatos, que significa "morte". A junção destes dois termos resulta na expressão "boa morte", também conhecida como "morte misericordiosa".

Os únicos textos bíblicos que fazem referência à eutanásia, em algum sentido dessa palavra, são Êxodo 23.7 e 2 Samuel 1.1-16. No primeiro, vemos que Deus proíbe o povo matar inocentes; e o segundo ilustra este princípio por meio da posição tomada por Davi contra o amalequita que requereu o mérito da haver tirado a vida de Saul, supostamente transpassado por uma espada em campo de batalha.

Nos dias atuais, tal procedimento é usado por médico, através da aplicação de algum tipo de agente (substância, medicamento, etc.).

Aqueles que defendem acelerar a morte de pacientes em estágio terminal, alegam que o objetivo é levá-lo à “morte misericordiosa”, pondo fim ao seu sofrimento intenso, argumentando que “não se deve manter artificialmente a vida subumana ou pós-humana vegetativa”, e que se deve evitar o padecimento de pacientes desenganados, com doenças incuráveis, moléstias prolongadas tais como câncer, AIDS e outras.

O grande apego emocional ao ente querido que se encontra desenganado pela medicina é uma circunstância delicada da Ética Cristã. Familiares e amigos, perguntam: Como não pensar em pôr fim ao sofrimento intenso da pessoa que amamos? 

Nestes casos, a definição de misericórdia aplicado à eutanásia é errada, pois a prática da misericórdia significa em ter a disposição para fornecer socorro até às últimas consequências, e isto não abrange tirar a vida com a suposta justificativa de estar abrandando a aflição de alguém.

A morte na Bíblia não é boa por definição. É a consequência do pecado e o apóstolo Paulo a chama de seu último inimigo (Gênesis 2.7; Romanos 3.23;1 Coríntios 15.26). Como é possível estar cumprindo a vontade de Deus ao praticar um ato que adianta a morte física de uma pessoa? Levando em consideração o ensino bíblico sobre o tormento eterno, que é tudo o que o futuro reserva àqueles que morrem sem conhecer a salvação em Jesus, como podemos antecipar a morte e provável tormento eterno de alguém motivados pela "misericórdia"?

2.2 As implicações da eutanásia.

O argumento em favor da eutanásia é humano e não tem base bíblica. Alega que deixar alguém sofrendo sem a perspectiva de sobrevivência é menos moral do que acelerar a morte para tal pessoa.

A prática da eutanásia tem implicações de ordem legal, moral e ética.
a. Nos aspectos legais, a Constituição Brasileira assegura a "inviolabilidade do direito à vida" (Art. 5°). Assim, a "eutanásia" é tipificada como crime no Código Penal Brasileiro (Art. 122). No entanto, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei n° 236/12 (Novo Código Penal) onde o juiz poderá deixar de aplicar punição para quem cometer a eutanásia seja ela passiva ou ativa.
b. Nas questões de ordem moral, nos deparamos com a violação do sexto mandamento "Não matarás" (Êxodo 20.13). Quando a "eutanásia" é consentida pelo paciente, surge o problema do pecado de suicídio. Pergunta-se ainda: a quem mais interessa a eutanásia? Ao paciente ou ao seu Plano de Saúde? As motivações parecem ser mais econômicas que humanitárias?
c. Legal. A eutanásia é um crime contra a vontade de Deus explícita no Decálogo. Portanto, somente Deus tem o direito de dar a vida e de tornar a tirá-la, pois é santa em si e em sua finalidade. Inevitavelmente, se reconhece o posicionamento da Bíblia neste assunto da eutanásia. Ela diz: “Não matarás…” (Êxodo 20.13). Daí, a tradicional ponderação de que a ação do médico, tirando a vida do paciente, é uma atitude contra a vontade de Deus, equiparável ao assassinato ou homicídio.
É importante saber respeitar o corpo humano como propriedade de Deus. “Matar por misericórdia”, mesmo com consentimento de quem está sofrendo, não é moralmente correto, e tal pedido equivale ao suicídio. Portanto, quem pratica esse tipo de eutanásia é cúmplice de suicídio.
Se a pessoa em sofrimento é crente e confiou todos os dias nas mãos de Deus, como poderá desejar que um familiar ou médico decida precipitar o fim da sua vida física? O crente fiel sabe que Deus planejou e controla o número de dias de sua vida e confia que lhe dará o número apropriado para vivê-los. Sabe que faz parte dos propósitos de Deus permitir que a maioria de seus filhos atravessem períodos de aflições. Dias estes que contribuem para o seu amadurecimento e santificação (Romanos 5.3- e 8.28; 2 Coríntios 4.16, 17; Tiago 1.2-4).

Como cristãos, o nosso dever é aliviar o sofrimento das pessoas por outros métodos e não tirando-lhes a vida. Mostremos, pois, que Deus tem um firme compromisso com a pessoa humana, desde a concepção à morte natural. Devemos incentivar todo esforço na tentativa de sua cura, seja por medicamentos, seja pela prece realizada usando a fé:
 "A oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados. Confessai as vossas culpas uns aos outros e orai uns pelos outros, para que sareis; a oração feita por um justo pode muito em seus efeitos” (Tiago 5.15,16).
Nesses tempos difíceis e trabalhosos, que todas as pessoas desse mundo saibam que o cristão evangélico é contra a eutanásia, pois a vida é sagrada aos olhos de Deus. A única morte desejável e boa que a Palavra de Deus se refere é o morrer na esperança cristã, conforme escreveu o apóstolo Paulo: 'Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro'(Fp 1.21). Certamente, o Juramento de Hipócrates, proclamado pelos médicos, deve ser considerado, prescrevendo que os mesmos não devem “dar remédio letal a quem quer que o peça, tampouco… fazer alguma alusão a respeito 

III – A VIDA HUMANA PERTENCE A DEUS


3.1 A fonte originária da vida.

A frase "No princípio Deus...", em Gênesis 1.1 marca o começo do Universo no tempo e espaço. Explica a causa da existência de todas as coisas com respeito à criação. Refere-se à criação da Terra e de tudo o mais sem material pré-existente, trazidos à existência a partir do nada. Refere-se à ação criadora do Deus verdadeiro que não possui começo e fim. O versículo 27 deste mesmo capítulo e livro, fala do momento em que o Criador fez o ser humano do pó da Terra, fez o casal Adão e Eva, obra prima de suas mãos, segundo sua imagem e semelhança. Somente Deus dá a todos a vida, a respiração e todas as coisas (Atos 17.25). A vida de toda a humanidade tem existência por causa da vontade do Altíssimo.

Jesus Cristo é o primogênito de todas coisas, sustenta todas as coisas vistas e não vistas e tudo subsiste e acontece dentro dessa realidade. Como Deus, Jesus Cristo criou o Universo material e espiritual para seu prazer e glória (Romanos 11.33-36; Hebreus 1.3; Colossenses 1.16-17). Assim sendo, o Senhor, que vive eternamente, é a fonte originária da vida e só Ele tem autoridade exclusiva para concedê-la ou tirá-la (Salmo 90.2; 2 Samuel 2.6).

3.2 O caráter sagrado da vida.

Reduzido à penúria total, sofrendo terrivelmente com chagas por todo o corpo, o patriarca Jó foi para onde os leprosos iam; o monte de cinzas fora da cidade, onde raspou suas feridas com um pedaço de cerâmica quebrada. Em meio a toda essa aflição, sua confiança permaneceu firme, de modo que sua esposa não pôde acusá-lo de insinceridade religiosa, como havia feito Satanás ao observá-lo cheio de saúde e prosperidade. Em essência, o argumento dela foi: "esqueça sua piedade e amaldiçoe a Deus e morra; não é mais necessário seguir na mesma fé de Abel, de Noé e de Abraão", dando a entender que a morte seria a solução de seus problemas. A resposta de Jó não foi um insulto ao dizer-lhe "como uma doida falas tu", mas a descrição da pessoa que despreza a Deus e à sua vontade. Ao rejeitar tal pensamento tolo, Jó demonstrou reconhecer o caráter sagrado da vida que Deus nos dá, e dessa maneira enalteceu a soberania divina sobre a existência humana e foi recompensado pelo Criador devido sua escolha em continuar a viver glorificando-o (Jó 2.9-10; e capítulo 42 inteiro; Salmos 14.1; 53.1).

Em Atos 3.15, Pedro descreve Jesus Cristo como o Autor da vida. A palavra grega para "autor" é originador ou iniciador de alguma coisa. Davi, no Salmo 36 e versículo 9, descreve ao Senhor desta maneira: " Porque em ti está o manancial da vida; na tua luz veremos a luz".

O Senhor observa o desenvolvimento da criança ainda no útero da mãe. Ele vê o início da gravidez, período divinamente planejado pelo Todo Poderoso para que o embrião ou feto esteja no interior do ventre de sua genitora, protegido de intempéries agressivas e outros riscos à vida (Salmos 139.13-16). Tudo está visivelmente nítido aos olhos do Criador.

A vida é um dom de Deus concedida ao homem. Só ao Criador cabe o direito de concedê-la ou suprimi-la, direta ou indiretamente, sem que se configure um crime. A vida não pertence ao ser humano. Toda concessão continua sendo de domínio do seu proprietário. Assim, não é da competência deste homem decidir o momento em que sua vida, ou de quem quer que seja deva ser destruída. Temos a incumbência de agir como bom administrador ou mordomo, com a finalidade de futuramente prestar contas ao seu legítimo dono, que é Deus. 

CONCLUSÃO

Na busca de respostas consistentes sobre a pena de morte e a eutanásia, que todo cristão busque conhecer a doutrina da Bíblia Sagrada, com o objetivo de possuir condição ao comportamento respaldado na vontade de Deus. E ponderar que a vida humana, sua sacralidade e dignidade, têm origem no Criador. Sabendo que atentar contra a vida humana, que é dom divino, significa colocar-se contra a soberania do Autor da vida.

O poder absoluto sobre a vida e a morte pertence a Deus. A ideologia que propaga o direito do homem em exterminar a própria vida, ou a do outro, viola o propósito divino (João 10.10).

Eliseu Antonio Gomes. Belverede.E.A.G.

Compilações

Ética Cristã Hoje - vivendo um Cristianismo coerente em uma sociedade em mudança rápida, Alan Pallister, páginas 130, 131, 146, 147, edição 2005, São Paulo (Shedd Publicações).
Lições Bíblicas Adulto. Valores Cristãos - Enfrentando as Questões Morais de Nosso Tempo, Douglas Baptista, lição 5 - Ética Cristã, Pena de Morte e Eutanásia, 2º trimestre de 2018.
Lições Bíblicas Adulto. Ética Cristã - Confrontando as questões morais. Lição 8: O cristão e a pena de morte, Elinaldo Renovato de Lima, 3º trimestre de 2002.
Lições Bíblicas Adulto, Ética Cristã - Confrontando as questões morais. Lição 9: O cristão, a eutanásia e o suicídio Elinaldo Renovato de Lima, 3º trimestre de 2002. 


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